Nos anos 1920, o engenheiro José Augusto Prestes projetou e construiu um caminhão no Rio de Janeiro. Até o motor era 100% nacional
Por: Jason Vogel
Para a maioria, Bandeirante é apenas um jipe da Toyota. Mas, na remota década de 1920, foi feito artesanalmente outro Bandeirante, obra de um engenhoso imigrante português residente no Rio. E a imprensa da época apresentou o caminhãozinho como “O primeiro automóvel fabricado no Brasil”!
Reportagens nos jornais cariocas de 1929 contam que o veículo, apresentado no dia 8 de janeiro daquele ano, foi inteiramente construído nas instalações da A. Prestes & C. Ltd..
Tratava-se de uma fábrica de máquinas para beneficiamento de café, onde também se faziam peças de reposição para automóveis. Localizada na Rua São Cristóvão 430, a firma tinha oficinas para fundição de ferro, aço, bronze e alumínio. Tal estrutura foi suficiente para criar um caminhão completo, com capacidade para 7 toneladas.
As partes de aço como chassi, rodas e até o motor (de 60hp) foram fabricadas ali mesmo, bem como todas as demais peças de bronze e alumínio. A construção foi dirigida pelo comendador José Augusto Prestes, personagem que bem merecia ter sua história transformada em livro.
Nascido em uma família rica de Benfica, Portugal, Prestes estudou engenharia mecânica nos Estados Unidos. Em 1891, participou de um golpe mal sucedido para implantar a república em Portugal. Como o rei não caiu, o jeito foi vir para o Brasil.
No calor carioca, começou a estudar sobre frigoríficos e abriu a primeira fábrica de gelo no país (antes, o gelo vinha da Europa!). O versátil luso fez de tudo: tocou as obras do palácio do governo em Manaus, montou sua siderúrgica (Usina Santa Luzia), além de construir e administrar o Cassino Theatro Beira Mar, no Passeio Público, Centro do Rio.
Republicano, sofreu um atentado a bomba, de anarquistas. E, como presidente do Vasco, abriu as portas do clube aos jogadores negros, em 1924. Diante de tantas histórias, fazer o primeiro caminhão do Brasil (batizado de Bandeirante em homenagem a um club homônimo de pioneiros automobilistas) parece até simples.
O radiador do Bandeirante, vale dizer, tinha uma faixa preta na diagonal – seria uma referência à camisa do Vasco? No alto do colete havia um escudinho com as letras SL, de Santa Luzia. Abaixo do radiador, uma grande placa ostentava o nome da A. Prestes & C. Ltd..
Seus cilindros eram destacáveis do bloco, com 125mm de diâmetro e 140mm de curso (ou seja: 1.718cm³ cada um), mas infelizmente não encontramos maiores informações técnicas sobre o modelo – nem sequer quantos cilindros tinha.
Pelas notas da imprensa, sabe-se que o único exemplar do auto-caminhão (como se dizia na época) foi embarcado, no dia 20 de janeiro de 1929, para a Exposição Ibero-Americana de Sevilha. Fazendo as contas, apenas 12 dias se passaram entre o evento de apresentação do Bandeirante, no Rio, e seu envio para a Europa.
A mostra espanhola, que exibiu produtos dos países ibéricos e latino-americanos, ficou aberta por um ano – houve gente por lá que duvidou que o veículo era inteiramente fabricado no Brasil.
Passado o entusiasmo inicial, os jornais nada mais publicaram sobre o destino do pioneiro Bandeirante. Assim, há boa chance de que tenha se tornando, também, o primeiro automóvel brasileiro vendido no exterior.
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